segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Do Supremo que me inspirou ao Supremo que me decepciona - #STF - #SupremoTribunalFederal - #Constituição1988 - #SupremaCorte - #TribunalConstitucional

 


Quando iniciei minha jornada no Direito, nos idos da década de 1980, o Supremo Tribunal Federal era para mim — como para tantos estudantes — um verdadeiro templo da razão jurídica.


Admirava profundamente os debates serenos e técnicos travados por ministros como Paulo Brossard, Sydney Sanches e Francisco Rezek. Havia, naquela composição, uma aura de equilíbrio, de sobriedade e de fidelidade ao texto constitucional que inspirava respeito e consolidava o Supremo como guardião da Carta Magna recém-promulgada.

 

Era um tempo em que o STF se mantinha em seu devido papel de poder contramajoritário, mas sem pretensões de se transformar em protagonista político. O Supremo de então era discreto, mas firme; técnico, mas humano; independente, mas consciente de seus limites institucionais.
Em suas decisões, predominava o primado do direito como ciência, e não a vontade pessoal ou a militância ideológica de quem o interpretava.

 

Passadas algumas décadas, é impossível não reconhecer o abismo que separa aquele Supremo que me inspirava deste que hoje me causa perplexidade.
A atual composição do STF parece, muitas vezes, ter se distanciado de sua função originária de guardião da Constituição, assumindo o papel de ator político de primeira grandeza — um poder que se imiscui, com frequência preocupante, nas competências dos outros dois.

 

Não é raro ver decisões judiciais com forte conteúdo político, acompanhadas de discursos morais e ideológicos. O que antes era o exercício técnico da jurisdição constitucional, hoje se confunde com o ativismo judicial — um fenômeno que, embora tenha raízes teóricas respeitáveis, em nosso contexto se converteu em uma prática perigosa de substituição da vontade popular pela vontade de poucos togados.

 

É impossível abordar esse tema sem mencionar alguns dos protagonistas do atual cenário.


O ministro Gilmar Mendes, cuja erudição é inegável, tornou-se símbolo de decisões contraditórias e de um personalismo que compromete a imagem de imparcialidade da Corte.


O ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, encarna a face mais autoritária de um Supremo que passou a concentrar poderes desmedidos, especialmente em matérias de natureza política e criminal.


E o ministro Roberto Barroso, com seu discurso messiânico sobre “a revolução da felicidade”, parece, por vezes, confundir o tribunal com uma tribuna de militância progressista.

O problema não é o brilho individual de cada ministro — pois o saber jurídico de muitos é inquestionável —, mas o uso indevido desse brilho para iluminar caminhos que fogem da Constituição e se projetam sobre o terreno pantanoso da política.

 

Outro ponto que agrava a crise de legitimidade do Supremo são as indicações presidenciais recentes.


Quando o mérito cede espaço à conveniência política, o resultado é a percepção de que o STF se tornou uma extensão do poder Executivo, e não um freio a ele.
A nomeação de Cristiano Zanin, advogado pessoal do presidente, e de Flávio Dino, ex-ministro da Justiça e aliado político do governo, evidenciam esse fenômeno.
Agora, cogita-se a indicação de Jorge Messias, atual Advogado-Geral da União e correligionário do presidente da República — o que reforça a sensação de captura institucional.

 

A Corte que outrora simbolizava a imparcialidade republicana parece hoje partidarizada, comprometendo a confiança da sociedade na justiça constitucional.


A toga, que deveria proteger a independência, vem sendo usada — ainda que simbolicamente — como instrumento de poder político.

 

Não escrevo estas linhas movido por rancor, mas por tristeza de quem viu o Supremo se transformar, de uma instituição admirada, pautada por luminares como Brossard, Rezek e Sanches, para uma arena de protagonismos individuais e decisões de impacto político direto.


A crítica, neste caso, não é à existência de juízes humanos, com opiniões e convicções — mas ao esquecimento do princípio fundamental de que juízes não governam, juízes julgam.

 

Ainda assim, conservo uma esperança — a de que o STF reencontre seu caminho, reencontre sua grandeza e volte a ser o farol da estabilidade jurídica e democrática que um dia foi.


Que os futuros ministros, ao tomarem posse, se recordem de que a toga não é um escudo para proteger governos, mas um símbolo da defesa da Constituição e da liberdade.

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